Arganil debateu prevenção de incêndios e resiliência do território

As portas do auditório da Antiga Cerâmica Arganilense abriram-se no passado dia 12 de julho para acolher o seminário que trouxe a debate a prevenção dos incêndios e a resiliência dos territórios do interior, numa sessão que contou com um diversificado painel de oradores, composto por especialistas nas áreas de gestão florestal e prevenção de incêndios.

Sob o olhar atento e interessado dos cerca de uma centena de participantes, o arquitecto paisagista Henrique Pereira dos Santos, baseando-se na análise demográfica das atividades económicas tradicionais, como a agricultura e a pastorícia, abordou a forma como as alterações sofridas nestes setores provocaram a falência dos modelos tradicionais de exploração dos recursos. Face a esta problemática, alertou para a necessidade de se encontrarem mecanismos de substituição, sem os quais não se conseguirá fazer face à crescente violência dos incêndios florestais.

Coube aos investigadores Miguel Almeida e Luís Ribeiro, da equipa do Prof. Xavier Viegas da ADAI – Universidade de Coimbra, debruçaram-se sobre o grande incêndio de Pedrogão Grande, fazendo uma apresentação exaustiva dos dados recolhidos, ao nível das habitações afetadas, indústria e vidas humanas, alertando para os comportamentos a ter em situações semelhantes, em prol da própria segurança e dos bens materiais.

Já o Professor Catedrático José Cardoso Pereira, do Instituto Superior de Agronomia da Universidade de Lisboa, apresentou um caso prático de diagnóstico e proposta de ordenamento florestal, implementado na freguesia de Alvares, no concelho de Góis. Naquela zona de produção intensiva de eucalipto para rolaria, à custa da intensificação da gestão florestal é possível, explicou, aumentar os ganhos económicos e, simultaneamente, diminuir os riscos de incêndio florestal.

A encerrar a manhã, o Professor José Gaspar, da Escola Superior Agrária de Coimbra, abordou a utilização do fogo prescrito, enquanto ferramenta colaborativa. Ilustrou as múltiplas ligações necessárias entre os operacionais e as entidades que a praticam, identificou os diferentes usos, direcionados às necessidades dos utilizadores do território, e apresentou o seu potencial para a gestão dos povoamentos florestais, para intervenções silvícolas de desbaste, desramações e tratamentos fitossanitários.

A tarde foi dedicada à realidade local, com o Presidente da União de Freguesias de Cepos e Teixeira, José Costa, na qualidade de representante da Entidade Gestora da área dos Baldios de Cepos e Casal Novo, a reunir as atenções durante a apresentação dos projetos em curso nessa área. A aposta passa, defendeu, pela implementação da silvo-pastorícia, aproveitamento das espécies autóctones, a produção de medronho, a apicultura e a valorização da paisagem, ao mesmo tempo que se reforça a proteção das populações detentoras destas áreas comunitárias tão representativas no concelho de Arganil e tão importantes do ponto de vista ambiental.

Rui Dinis, Presidente da Associação de Produtores Florestais do Concelho de Arganil, refletiu sobre as dificuldades e as oportunidades que a floresta, maioritariamente privada, enfrenta. De forma sucinta, apresentou as políticas e os enquadramentos legislativos que têm enquadrado o sector ao longo dos anos e as dificuldades com que os proprietários florestais constantemente se debatem.

Coube a Luís Paulo Costa, presidente da Câmara Municipal de Arganil, protagonizar um dos momentos mais aguardados do seminário, com a apresentação do projeto “A Floresta da Serra do Açor”. Trata-se de um modelo de gestão inovador e multifuncional, conforme avançou, que se propõe a garantir uma gestão integrada e profissional do espaço florestal do concelho. Tendo surgido da “necessidade de se ordenar a floresta, fazendo do incêndio de outubro de 2017 uma oportunidade para reorganizar a área florestal do nosso território”, o projeto prevê numa primeira fase intervenções em dois mil hectares de áreas comunitárias (que representa 16% da área florestal do concelho), aliando a floresta de produção com atividades complementares, como a pastorícia, a apicultura, a criação de caminhos florestais, a aposta em espécies autóctones e a preservação da biodiversidade e ecossistemas.

O objetivo passa por devolver à Serra do Açor, de forma faseada, o seu coberto florestal de uma forma mais harmoniosa com as suas potencialidades, diversificando as espécies exploradas e adequando o nível de gestão às características do terreno. Em causa está a riqueza paisagística que caracteriza a Serra do Açor, que dá não só suporte à atividade turística como está na base de atividades económicas que, de forma direita ou indireta, é possível explorar, como madeira, cortiça, cogumelos, medronho, apicultura e silvo-pastorícia, ao mesmo tempo que contribuem para um território progressivamente mais rico, mais resistente e mais resiliente aos incêndios florestais.

Este modelo de gestão de ordenamento e revitalização do território, concluiu Luís Paulo Costa, tem o apoio financeiro de privados e o suporte técnico da Escola Superior Agrária de Coimbra, unindo em torno do mesmo desígnio o Município de Arganil, as associações de compartes, as Juntas e Uniões de Freguesia, o ICNF, a Associação dos Produtores Florestais, o Clube de Produtores, entre outras entidades do concelho.

A sessão contou, ainda, com uma apresentação de equipamentos inovadores para a gestão dos espaços florestais. A cargo da Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica Industrial (ADAI), da Universidade de Coimbra, esteve a demonstração prática de utilização de um veículo de pequena dimensão operado por controlo remoto, equipado com destroçador de martelos com grande capacidade de manobra.

Pautado por períodos de intervenção do público, para manifesto do seu testemunho, sugestões ou para esclarecimento de dúvidas, mais ou menos técnicas, o seminário terminou com uma mesa-redonda constituída por todos os intervenientes. Reforçaram-se ideias e convicções exploradas durante o dia, chegando-se ao consenso generalizado da necessidade de atuação do Estado, mas também do cidadão comum, que, enquanto proprietário dos espaços florestais, acaba por ganhar o papel de ator principal no cenário de mudança que se exige.